Santa Cruz Cabrália, na Bahia, foi o ponto de encontro entre Portugal e Brasil no primeiro capítulo da história da nossa relação. Foi ali que, em 26 de abril de 1500, quatro dias após a chegada da esquadra de Pedro Álvares Cabral, celebrou-se a primeira missa em terras brasileiras, em Coroa Vermelha, conduzida por frei Henrique Soares de Coimbra.
Uma grande cruz com as armas e divisas reais de Portugal foi erguida para marcar o evento religioso. Batizada em homenagem ao comandante português, a primeira cidade da chamada Costa do Descobrimento está localizada a 23 quilômetros do Aeroporto Internacional de Porto Seguro.
É o marco nos rumos da história e que nos mudaria para sempre. Com cerca de 35 quilômetros de litoral paradisíaco, o local convida os viajantes a seguir os passos de Cabral e a explorar a terra com o deslumbramento de quem encontrou o paraíso.
Em abril, por conta das celebrações da chegada ao Brasil pelos portugueses, a cidade proporciona eventos culturais e uma missa no local, mantido com uma cruz até hoje.
Os anfitriões
Dos 30 862 habitantes de Santa Cruz Cabrália, 7 100 são indígenas, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Entre eles está um grupo que habita a região desde muito antes da chegada dos europeus, os pataxós, cuja cultura está espalhada por toda cidade.
No ponto onde Cabral mandou erguer a cruz, por exemplo, encontra-se hoje o famoso Patashopping, um centro comercial onde os indígenas vendem seus artesanatos. A poucos passos dali é possível visitar a reserva Txag'rú Mirawê, onde vivem cerca de 65 famílias, incluindo 60 crianças e 30 idosos.
Os turistas são recebidos com danças tradicionais e cânticos no idioma daquele povo, o patxôhã, e em português. No fim da apresentação, todos são convidados a fazer parte da roda.
As famílias também vendem seu artesanato enquanto o líder cultural e um dos conselheiros do cacique conta a história de seu povo.
“Sinto que a população tem se preocupado em conhecer a nossa cultura", disse à reportagem Makiami Kahtãgá, que significa senhor da lealdade.
O conhecimento traz resultados. Faz alguns anos que, segundo Lahtãgá, cresce o movimento de revitalização do patxôhã, com aulas para crianças e jovens nas aldeias e esforços para documentar e preservar a língua.
Em 2000, para comemorar os 500 anos da chegada dos portugueses ao Brasil, um grupo de intelectuais e líderes pataxós traduziu a Carta de Pero Vaz de Caminha para sua língua.
Eles levaram até Portugal a versão do documento A Carta de Pero Vaz de Caminha é o primeiro documento escrito da história do Brasil e foi enviada o rei dom Manuel 1º para detalhar o descobrimento das novas terras.
Num dos trechos, ele descreve a missa: “Ao domingo de Pascoela pela manhã, determinou o Capitão ir ouvir missa e sermão naquele ilhéu. E mandou a todos os capitães que se arranjassem nos batéis e fossem com ele. E assim foi feito.”
Mais informações sobre os indígenas da região também são conhecidas no Museu Indígena Pataxó da Aldeia Coroa Vermelha, com exposição a céu aberto de utensílios, vestimentas, adereços e documentos históricos que ilustram a resistência daquele povo.
Centro Histórico e atrações
No Centro Histórico de Cabrália, destacam-se a Igreja de Nossa Senhora da Conceição Barroca, do século 18, um antigo cemitério, as ruínas de um colégio jesuíta, a Câmara e a cadeia, um edifício tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.
O prédio funciona como arquivo público municipal de Santa Cruz Cabrália e lá estão expostos permanentemente os achados do sítio arqueológico escavado na praça histórica.
Um pouco adiante, avistamos o sugestivo mirante Ai Que Lindo, no Parque da Preguiça, de onde o visitante tem uma das vistas mais lindas do Rio João de Tiba e da barreira de corais da Baía de Cabrália.
Ali no Parque, que é uma área de preservação ambiental, o público pode fazer caminhadas, trilha e piquenique entre preguiças, capivaras e raposas, além de bromélias, orquídeas e diversas espécies de plantas.
E quem quiser ver de pertinho os recifes observados do alto, a sugestão é visitar o Parque Marinho de Coroa Alta, a uma hora de navegação. Eles têm cor alaranjada e, na maré baixa, formam-se, piscinas naturais com várias espécies de peixes e corais como garoupas, baiacus e cavalos-marinhos.
É também durante a vazante que surge uma enorme passarela de areia no meio da praia de Coroa Vermelha, conhecida como “Caminho de Moisés”, dando para andar até oitocentos metros mar adentro.
O amor também foi descoberto na Bahia, desta vez por um uruguaio, e dele nasceu a parrillada (churrasco uruguaio) mais famosa de Cabrália. Em 1992, José Topolanski conheceu a baiana Marcia Monteiro e, juntos, ergueram o Parque Ecológico Fazenda Mãe Tereza.
O local conta com lago, piscina infantil, tirolesa, toboáguas, passeios de caiaque e cavalo, trilhas, banho de lama no Rio Camurugi. Tem também trenzinho com tour panorâmico e uma marina de onde se desce pelo rio, entre outras atrações.
O acesso é por meio de ingresso day use, com alimentação e bebidas à parte.
Onde o mundo se encontra à mesa
Da América Latina à Europa, estrangeiros deixaram sua marca na gastronomia de Cabrália. No Recanto do Sossego, uma pizzaria à beira mar, os italianos Miky, Andrea e Marco, oferecem desde 2007 massas caseiras, bruschettas e uma caldeirada com lagostas, camarões e peixes nobres e graúdos.
Ali pertinho, o restaurante Caçuá, que fica dentro do Príncipe do Mutá Hotel Design e onde se tem uma vista panorâmica da paisagem ao redor, mistura a culinária americana e argentina com a brasileira, incluindo opções vegetarianas, sem lactose e veganas.
Também italianos, os chefs Francesca D'Aliesio e Paolo Gioggi produzem suas massas ali mesmo no seu Trigo, um restaurante em frente ao Rio Camurugi que mais parece a cozinha da “nonna”, com frigideiras penduradas e fotografias de algumas regiões da Itália expostas nas paredes.
É tão familiar que a filha deles brinca na cozinha americana enquanto a profissional conversa com o público. O espaço comporta cerca de trinta pessoas.
Do outro lado da calçada tem o Seu Beira Mar, aberto por dois paulistas e um natural de Cabrália, num imóvel histórico em frente ao cais. O nome do restaurante é uma homenagem ao protetor e fiel dos bravos navegantes nos dias de tormentas.
Viko Tangoda, de Fernandópolis, de São Paulo, é o responsável pelo cardápio que traz as origens orientais do premiado chef com toques brasileiros como a tapioca com maionese de missô e o magnífico tartar de camarão com crisp de shari.
Rio João de Tiba e Santo André
Cabrália é dividida pelo Rio João de Tiba, cartão postal do município e possivelmente batizado com o nome de um português que morou na região. Suas águas possibilitam passeios de barco ao longo do seu curso. No roteiro, ilhas fluviais e recifes de corais localizados em mar aberto, mangue, caranguejos, aratus e garça-azul.
É por ele que se chega à Vila de Santo André, refúgio de praias desertas e gastronomia sofisticada, além de hotéis de luxo e pousadas à beira-mar.
O local ganhou notoriedade ao abrigar a delegação alemã durante a Copa do Mundo de 2014. O grupo ficou hospedado no Campo Bahia, um hotel boutique frente ao mar com 13 vilas confortáveis em meio à vegetação. A entrada, uma mandala filtro dos sonhos feita pelos indígenas da região, demonstra que é um lugar de onde você não vai querer despertar.
Além de uma enorme piscina, spa, beach lounge entre outros serviços de luxo, o local abriga o Flor de Caju Restaurante, com ingredientes locais que compõem o melhor da gastronomia regional. Aliás, hotéis com invejada infraestrutura é o que não falta na região. Muitos oferecem serviço completo com direito à alta gastronomia.
No vizinho Villa Angatu Eco Resort & Spa, 122 acomodações são divididas em cinco categorias, que podem receber de duas a quatro pessoas, sendo elas: suíte master e suíte luxo, que comportam até duas pessoas; chalé e standard, que comportam até três pessoas e luxo família, ideal para casais que viajam com até dois filhos. E cada vila está elencada a um estilo diferente.
Conta-se que o primeiro investidor do local era um italiano apaixonado pelo Brasil, em especial pela história da cidade mineira de Ouro Preto. Por isso, levou as características daquela região para o empreendimento. Mas não só. Outra vila lembra o charme e a tranquilidade da cidade fluminense de Paraty. E lembra muito mesmo. Ao caminhar pelo resort, a impressão que dá é a de que você foi transportado da Bahia para o século 17. Tem até um prédio inspirado em um mosteiro de freiras.
O restaurante deles, o Aromar, serve o café da manhã em regime de buffet e funciona para o almoço e jantar em formato la carte, que vai da cozinha baiana à internacional.
Como o Maroca Pousada de Charme, com dez acomodações a poucos passos da areia, e que também funciona como restaurante e pizzaria, comandado pelo premiado chef Danilo Amaral. O carro chefe da casa é a moqueca, talvez a melhor que você vai comer em toda Bahia. Na receita, ele adicionou banana-da-terra e o fruto do dendê, conferindo um toque especial ao prato.
Outra opção para comer em frente ao mar, dessa vez o Rio João de Tiba, é no Restaurante Gaivota, com uma varanda aconchegante de onde se pode degustar um variado cardápio que vai de bife ancho ao bacalhau. Ele leva a consultoria do chef Wladi Umezu, do tradicional restaurante El Gordo, de Trancoso. O local ainda oferece hospedagem.
Ao lado, o Píer João de Tiba também funciona como um lounge e é decorado com pinturas pataxós e artesanato local que remetem à história da região. Na mesa, pratos típicos da culinária baiana como o camarão empanado no coco com molho de pimenta dedo-de-moça, ceviche de coco verde com crocante de banana e dadinhos de tapioca com duo de queijo. Os drinks também são uma delícia.
Dendê com queijo
Santo André também leva um toque mineiro. No Luz de Minas, o simpático casal Said e Renata Dias, de Santa Bárbara, faz uma mistura incrível desses dois estados como a casquinha de siri com queijo canastra e farofa ou o chutney de rapadura e mostarda. Tudo podendo ser acompanhado com aquela conhecida cachaça mineira.
Para a sobremesa, brigadeiros surreais de bom que a própria Renata faz: para vender o doce, ela colocou uma bike retrô personalizada no meio do espaço, que também oferece hospedagem.
A culinária oferecida na Barraca Elias & Leonice, na Vila Guaiú, não é tão sofisticada como a de um hotel de luxo, mas dá para ostentar muito comendo o pastel de siri com a caipirinha de biribiri (fruta típica da região) em frente ao mar onde água doce e salgada se encontram.
Serviço
Para quem quer conhecer Santa Cruz Cabrália, a Porto Azul —parceira local da Azul Linhas Aéreas— oferece diversos pacotes para os turistas, tanto para grupos quanto individuais.
*A jornalista viajou a convite da prefeitura do Município de Santa Cruz Cabrália em parceria com a Azul Linhas Aéreas.
Editor de texto: Nonato Viegas
Editora de página: Déborah Lima
Imagens: divulgação
Editor de conteúdo: Nicolás Satriano
Editor-chefe: Nonato Viegas
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