Às 13h24 desta segunda-feira (17), Portugal foi abalado por um terremoto de 4,7 na escala de Richter (que mede a intensidade deste tipo de fenômeno).O epicentro foi localizado a 14 quilômetros de Lisboa. Não há registro de feridos ou de danos estruturais. Para milhares de brasileiros que moram no país europeu, em especial Lisboa, onde os abalos foram sentidos, essa é a terceira experiência do tipo em seis meses.
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Em agosto do ano passado, um sismo de 5,3 foi sentido em cidades de Norte a Sul de Portugal. Em setembro de 2024, outro abalo, de magnitude 3,1, com epicentro a 30 quilômetros ao Sul de Sesimbra.
E o tema terremoto, com frequência cada vez maior, acaba assustando brasileiros. É possível que todos os brasileiros que vivem em Portugal tenham ouvido falar do terramoto de 1755, que matou mais de 10 mil pessoas.
O grande terremoto de 1755
O sismo de 1755 foi no dia 1º de novembro de 1755, feriado do Dia de Todos os Santos, e destruiu quase completamente a cidade de Lisboa, especificamente a Zona da Baixa, e grande parte do litoral do Algarve e Setúbal.
O terremoto do século 18 teve magnitude entre 8,7 e 9 na escala Richter, e foi seguido de um maremoto, com ondas de até vinte metros de altura (o equivalente a um prédio de sete andares), que entraram pela foz do Rio Tejo.
O sismo e suas consequências (incêndios e um tsunami) mataram, segundo estimativas históricas, 90 mil pessoas. Os múltiplos incêndios ocorreram por conta das velas acesas em homenagem ao feriado.
Foi uma das maiores tragédias naturais da Europa, exigindo uma resposta rápida e cara para a sua reconstrução. O rei dom José 1º e Sebastião José de Carvalho e Melo (futuro marquês de Pombal) giraram a engrenagem do Estado para arrecadar mais.
A manobra financeira permitiu à Coroa Portuguesa cobrar impostos sobre pedras e metais preciosos vindos do Brasil que, em valores atuais, chegariam a 25,5 bilhões de euros (ou 143,5 bilhões de reais), se considerarmos dados de dois livros (detalhamos no final da matéria) que estimam a extração do ouro entre cem e 150 toneladas.
Esse valor equivale a cerca de 62,4 programas equivalentes ao Bolsa Família, que tem orçamento de 2024 da ordem de 2,3 bilhões de reais.
A colônia que salvou a metrópole
“Sem a riqueza de Minas Gerais, Lisboa jamais teria se reerguido dos escombros”, afirmou ao jornal Estado de Minas a professora de história da Universidade Federal de Minas Gerais Adriana Romeiro, autora de vários livros sobre o período colonial brasileiro.
A reconstrução de Lisboa exigiu uma quantidade massiva de recursos financeiros, e foi do Brasil que veio grande parte dos fundos necessários.
Segundo a enciclopédia Britânica, a reconstrução de Lisboa teve o impacto econômico que varia entre 32% e 48% do Produto Interno Bruto de Portugal na época. O PIB atual de Portugal é de 260 bilhões de euros.
Portanto, se os cálculos da Britânica estiverem corretas, a reconstrução, fosse hoje, custaria entre 83,2 bilhões de euros (519,33 bilhões de reais) e 124,8 bilhões de euros (778,99 bilhões de reais).
Cofres vazios
Pombal se tornou o secretário de Estado de Negócios Estrangeiros em 1750 e encontrou o tesouro real no vermelho, por conta dos excessos dos gastos do rei dom João 5º.
No seu reinado surgiram:
- o Palácio Nacional de Mafra;
- a Biblioteca Joanina, da Universidade de Coimbra;
- o Aqueduto das Águas Livres em Lisboa;
- e a maior parte da coleção do Museu Nacional dos Coches, um dos mais importante do mundo.
O filho e sucessor de dom João 5 foi dom José 1º, que assumiu o trono em 1750. Ele nomeou Sebastião José de Carvalho e Melo (futuro marquês de Pombal) como seu ministro dos negócios estrangeiros, que reforma a máquina fiscal portuguesa em busca de novas receitas.
Uma das novidades foi a criação do quinto, imposto cobrado pela Coroa de Portugal em suas colônias, nomeadamente no Brasil. Correspondia a 20% do metal extraído.
O imposto incidiria mesmo antes do descobrimento das minas de ouro no Brasil, estabelecendo os direitos reais, entre outros, os locais de extração de ouro e prata ou qualquer outro metal.
Dom José 1º era avô de dom João 6º e bisavô de dom Pedro 1º (dom Pedro 4º, para os portugueses).
A escritora Ana Cristina Silva acaba de lançar o romance “El-Rei, Nosso Senhor, Sebastião José”, que conta a história do rei que implementou uma nova política socioeconômica e que levou ao aumento da arrecadação sobre as colônias.
“As mudanças vieram antes do terramoto. E com elas, dom José 1º e o marquês de Pombal conseguiram dinheiro para enfrentar o desafio da reconstrução de Lisboa”
Os impostos recolhidos no Brasil foram essenciais para a recuperação de Lisboa, mas também tiveram impactos políticos profundos na colônia. Entre 1755 e 1768, estima-se que o Brasil exportou para Portugal ao menos uma centena de tonelada de ouro e diamantes.
Durante o século 18, o Brasil foi a maior fonte de ouro e diamantes do mundo. As exportações de ouro alcançaram seu pico na década de 1760 (por conta do sistema implantado por Pombal).
A intensificação da exploração das minas e o aumento dos tributos geraram descontentamento entre os colonos, levando a movimentos de resistência e a um crescente sentimento de independência. Tudo isso culminou na Independência, 67 anos depois, em 1822.
Toneladas de ouro e diamantes exportados
Não há números precisos sobre a quantidade de pedras de metais preciosos levados do Brasil para Portugal. Estima-se que entre 1700 e 1822 as exportações tenham sido da ordem de 800 toneladas de ouro.
Um número mais preciso, para o período de 1755-1765 (regência de dom José 1º e o mais intenso período de reconstrução de Lisboa), poderia estar entre 100 e 150 toneladas de ouro, considerando o pico de produção e a intensificação da extração.
Esses dados constam dos livros "Conflicts and Conspiracies: Brazil and Portugal 1750-1808", do historiador Kenneth Maxwell, e "The Treasure of the Spanish Empire: The Transfer of American Silver to Spain and Portugal, and Its Consequences, 1500-1800", dos historiadores John H. Elliott e Henry Kamen.
Além do ouro, os diamantes extraídos principalmente em Minas Gerais também foram significativos.
Entre 1729 e 1807, foram enviados aproximadamente 3 milhões de quilates de diamantes, o que equivale a cerca de 600 quilos de diamantes, dados documentados por historiadores como Leslie Bethell em "Colonial Brazil".
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