O gabinete de Alexandre de Moraes enviou mensagens de forma não oficial à Justiça Eleitoral brasileira ordenando a produção de relatórios para embasar decisões do próprio ministro contra aliados e apoiadores de Jair Bolsonaro no inquérito das fake news no Supremo Tribunal Federal durante e após as eleições de 2022.
A Folha de S.Paulo, que veiculou as informações, afirma ter obtido o material com fontes que tiveram acesso a dados de um telefone que contém as mensagens. O jornal informa, ainda, que os dados que motivaram as reportagens não são fruto de interceptação ilegal das comunicações nem acesso hacker.
O que dizem as mensagens?
Os diálogos reproduzidos nas reportagens da Folha mostram como o setor de combate à desinformação do Tribunal Superior Eleitoral, presidido à época por Moraes, foi usado de modo não previsto pelo rito processual como um braço investigativo do gabinete do ministro no Supremo.
Em alguns momentos das conversas, assessores do ministro relataram irritação de Moraes com a demora no atendimento às suas ordens. "Vocês querem que eu faça o laudo?", consta em uma das reproduções de falas do ministro Alexandre de Moraes. "Ele cismou. Quando ele cisma, é uma tragédia", comentou um dos assessores dele. "Tá bravo agora", disse outro.
Em vários casos os alvos de investigação eram escolhidos pelo ministro ou por seu juiz assessor. Os diálogos revelam também que os relatórios eram ajustados quando não ficavam da maneira exigida pelo gabinete do STF e, em alguns episódios, foram feitos sob medida para embasar uma ação pré-determinada, como multa ou bloqueio de contas e redes sociais.
Quem participa da troca de mensagens?
A Folha afirma ter tido acesso a mais de seis gigabytes de mensagens e arquivos trocados através do WhatsApp por auxiliares de Alexandre de Moraes. Entre os que foram alvos do vazamento está o principal assessor do ministro no Supremo e que ocupa até hoje o posto de juiz instrutor, uma espécie de auxiliar no gabinete, além de outros integrantes da sua equipe no TSE e no STF.
O que mais mostra o vazamento?
Segundo os áudios publicados pelo jornal, o juiz instrutor Airton Vieira se mostrou preocupado com a forma de atuação dos gabinetes do ministro. "Formalmente, se alguém for questionar, vai ficar uma coisa muito descarada, digamos assim. Como um juiz instrutor do Supremo manda [um pedido] pra alguém lotado no TSE e esse alguém, sem mais nem menos, obedece e manda um relatório, entendeu? Ficaria chato."
O outro lado
O gabinete de Alexandre de Moraes disse à Folha que "todos os procedimentos foram oficiais, regulares e estão devidamente documentados nos inquéritos e investigações em curso no STF, com integral participação da Procuradoria-Geral da República".
O presidente Lula está envolvido nesta situação?
Não. O Supremo Tribunal Federal funciona de maneira autônoma, como um dos poderes da República, não sofrendo interferência do presidente da República.
O ministro Alexandre de Moraes não tem ligação política com Lula nem com o PT. Ele foi indicado para o STF pelo ex-presidente Michel Temer.
Durante o governo de Geraldo Alckmin (atual vice-presidente) à frente da administração de São Paulo, o hoje ministro foi secretário de Segurança Pública. À época, Alckmin era adversário do PT e de Lula.
O vazamento favorece Jair Bolsonaro?
Politicamente, o ex-presidente ganha discurso política de perseguido.
E agora?
É cedo para entender todos os desdobramentos dos vazamentos envolvendo o ministro Alexandre de Moraes, mas tanto Jair Bolsonaro como sua defesa ganharam argumentos (dificilmente verdadeiros) contra uma possível prisão num futuro próximo e poderão alegar mentirosamente —como alegam hoje e alegavam no passado recente— que o ex-presidente é vítima de perseguição.
De fato, as mensagens entre os assessores de Alexandre de Moraes indicam que o ministro deixou de observar os ritos processuais e poderão ter alguma implicação nos casos específicos.
Não é o caso, por exemplo, do processo em que o ex-presidente foi condenado e se tornou inelegível. O relator da ação foi o ministro Benedito Gonçalves, então corregedor-geral da Justiça Eleitoral.