Eça de Queiroz é um dos nomes mais emblemáticos da literatura portuguesa. Crédito: Reprodução.

Eça de Queiroz é um dos nomes mais emblemáticos da literatura portuguesa. Crédito: Reprodução.

O elo entre Eça de Queiroz e o Brasil

Anos após deliberações, corpo de Eça de Queiroz é transladado para o Panteão Nacional de Portugal. Literatura de Queiroz ultrapassa limites de tempo e permanece sua relação com o Brasil

08/01/2025 às 16:51 | 3 min de leitura | Cultura, Diversão e Arte
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Num artigo para a Revista do Instituto do Ceará, ainda em 1946, o jurista Dolor Barreira contava que os livros de Eça de Queiroz eram lidos “febrilmente, freneticamente, absorventemente…” no Brasil do fim do século 19, início do 20. 

De lá para cá, a literatura queirosiana continua a influenciar gerações que se encantam com histórias em língua portuguesa — traduzidas ou no original. 

A figura do autor de "Os Maias", mesmo após a morte, continua a despertar debates, como as intensas polêmicas em torno do translado de seus restos mortais para o Panteão Nacional, em Portugal. 

O atraso nesse processo expôs um impasse familiar: seis bisnetos de Eça defendem que o desejo do escritor era repousar para sempre no Douro, enquanto outros 22 descendentes, com apoio do Supremo Tribunal Administrativo, discordam. 

O presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, discursou durante a cerimônia de concessão de Honras de Panteão Nacional a Eça de Queiroz. Crédito: Lusa

Mas a verdade é que a obra de Eça pertence a todos os lugares. Curiosamente, ele jamais visitou o Brasil, mas sua relação com o país é marcante e única.

A origem e o vínculo com o Brasil

José Maria d’Almeida Teixeira de Queiroz, pai de Eça, nasceu no Rio de Janeiro, em 1820. Isso porque a família se refugiava no então Estado do Brasil, parte do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, às vésperas da independência brasileira.

Quando jovem, na época em que era delegado do procurador régio da Vila de Ponte de Lima, Norte de Portugal, José Maria se envolveu com a jovem Carolina Augusta Pereira d’Eça. Do relacionamento nasceu, em 1845, José Maria, que viria a se tornar o maior nome do Realismo português.

Para preservar o nome da família Pereira d’Eça, Carolina deu à luz na então Vila de Póvoa de Varzim, fugindo dos olhares indiscretos. O bebê foi entregue aos cuidados de Ana Joaquina Leal de Barros, uma costureira natural de Pernambuco, que se tornou sua madrinha e ama.

“Aqui começam as relações de Eça de Queiroz com o Brasil”, afirmou o arquiteto e historiador Alfredo Campos Matos, autor de "Eça de Queiroz: Uma Biografia", ao site da Editora da Unicamp.

Relações com o Brasil e os brasileiros

Eça de Queiroz manteve relações estreitas com brasileiros, especialmente no período em que viveu em Paris. Entre seus amigos estavam o intelectual Eduardo Prado e o poeta Olavo Bilac. Antes disso, em Londres, foi próximo do escritor e diplomata Domício da Gama.

No campo literário, os primeiros contatos com o Brasil ocorreram no periódico "As Farpas", quando Eça escreveu textos como a crônica "O Brasileiro", que caricaturava o habitante do país de forma depreciativa, visão que mudou posteriormente, segundo Campos Matos.

A partir de 1880, Queiroz inicia uma importante colaboração, que durou 16 anos, com a Gazeta de Notícias, do Rio de Janeiro. Neste periódico foram publicadas "A Relíquia" e "Cartas de Fradique Mendes", bem como todas as crônicas depois reunidas em livros, com os títulos "Cartas de Inglaterra", "Ecos de Paris", "Cartas Familiares" e "Bilhetes de Paris".

O Brasil também aparece na obra literária queirosiana. Em "O Primo Basílio", o protagonista é um jovem que retorna a Portugal após fazer fortuna no Brasil. O livro, publicado em 1878, foi um sucesso no Brasil, embora tenha enfrentado críticas de Machado de Assis, que acusava Eça de imoralidade e inconsistência em suas personagens.

As críticas de Machado de Assis, publicadas sob o pseudônimo de Eleazar, destacavam a “medula da composição” como sendo moralmente repreensível. Campos Matos aponta que essa crítica, embora severa, influenciou tanto Machado quanto Eça. O escritor português passou a refletir sobre sua abordagem literária, enquanto Machado evoluiu para sua fase mais madura.

Apesar das divergências, a recepção da obra de Eça no Brasil foi extremamente favorável, com jornalistas cariocas defendendo-o publicamente. O fascínio pelo escritor gerou até um neologismo criado por Monteiro Lobato: “ecite”, um sentimento de admiração pela escrita de Eça de Queiroz.

O legado

A popularidade de Eça no Brasil superou a de Portugal durante o século 19, mantendo-se viva com estudos, reedições e interpretações. 

Autores como José Lins do Rego reconhecem em Eça um mestre que desafiou as normas do Romantismo, trazendo irreverência e elegância para a literatura. 

Hoje, dá nome a praças, como a instalada no bairro da Madalena, no Recife, e monumentos, a exemplo do que acontece no Rio de Janeiro. 

Passados 125 anos desde a sua morte, Eça segue ocupando, figurativa e literalmente, um lugar no panteão dos escritores em língua portuguesa —em qualquer variante.

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