Desde que em junho deste ano o atual governo mudou a legislação para estrangeiros no país, o número de processos na Justiça contra a Aima mais do que duplicou. Os dados a seguir são dos Tribunais Administrativos e Fiscais da zona geográfica de Lisboa e Ilhas, e foram obtidos com exclusividade pela BRASIL JÁ.
Entre 1º de janeiro e 7 de junho deste ano, a Aima foi alvo de 5 590 novas ações judiciais que tratam de "intimação para defesa de direitos, liberdades e garantias". E de 8 de junho ao dia 11 de setembro foram movidos contra a agência mais 14 162 processos.
(Veja mais abaixo a resposta da Aima sobre os dados obtidos pela BRASIL JÁ)
Ao todo, a Aima chegou ao dia 11 deste mês com 14 868 demandas nos tribunais administrativos de Lisboa e das Ilhas porque parte das ações foi julgada. Ainda assim, o resultado demonstra que imigrantes que podem contratar um advogado têm optado por levar a Aima à Justiça para tentar garantir um atendimento no órgão.
Atualmente, há uma disputa até sobre o número de processos de migração pendentes na agência. Segundo o governo, são 400 mil procedimentos. O ex-presidente do sindicato que representava os servidores do antigo SEF, Acácio Pereira, nega e diz ser menor o estoque. Uma fonte informada da agência afirmou à BRASIL JÁ serem 180 mil processos. De todo modo, são milhares de estrangeiros presos no gargalo burocrático.
É uma situação que se arrasta desde a criação da agência, em outubro de 2023. Mas os números revelam que em 2024 houve uma piora considerável na situação dos estrangeiros —e a saída tem sido acionar os tribunais. Para se ter ideia, em 1º de janeiro eram 574 demandas na Justiça. De lá para cá, o número ultrapassou os 14,8 mil processos.
Os dados obtidos pela reportagem também permitem concluir que, considerando apenas os dias úteis, só este ano a Aima foi alvo de 81 ações por dia.
Dos 5 590 processos contabilizados entre janeiro e junho, 1 977 foram respondidos pelos magistrados, que percentualmente significa que 32% das demandas foram concluídas nos tribunais. Nos três meses seguintes, entre junho e início de setembro, a Justiça conseguiu enxugar 3 481 ações, ou 19% dos processos.
Enxurrada de processos
Os três últimos meses representaram uma verdadeira enxurrada de processos contra a Aima em tribunais da zona de Lisboa e Ilhas. As 14 162 novas ações movidas contra a agência representam mais do que o dobro do total registrado nos cinco meses anteriores.
O período coincide com a atualização da Lei de Estrangeiros, em 3 de junho, quando o governo acabou com a manifestação de interesse —um instrumento legal que permitia a estrangeiros se regularizarem já estando em Portugal.
Frente às 5 590 ações novas apresentadas nos cinco primeiros meses do ano, os 14 162 processos registrados naqueles tribunais nos três meses seguintes representam um crescimento de 153% nas demandas judiciais contra a agência.
Os números também transparecem que o volume de trabalho nos tribunais aumentou consideravelmente e comprometeu a capacidade de resposta da Justiça aos pedidos. Isso fica evidente quando comparados os percentuais de produtividade dos dois períodos: 32% das ações respondidas nos cinco primeiros meses e 19% nos três meses seguintes.
Aima sugere 'serenidade' aos imigrantes
Em nota à BRASIL JÁ, a Aima afirmou que ser uma instituição que "cumpre as suas obrigações" e, portanto, acrescentou que "cumpre toda as ordens que sejam emanadas do poder judicial" —veja a íntegra da nota ao final do texto.
A agência também informou que faz um esforço tremendo para regularizar os processos de residência pendentes e busca acolher com dignidade quem procura os serviços do órgão, além de tomar as medidas para "conferir aos residentes as garantias devidas ao nível da segurança interna".
De acordo com a agência, a chamada estrutura de missão (força-tarefa) criada para resolver a fila de pedidos de residência "tem a incumbência legal de assegurar que todos os cidadãos estrangeiros que tenham remetido a sua manifestação de interesse até o dia 3 de junho de 2024 vão ver designada data para o agendamento nos diversos centros especializados que foram e serão abertos".
Acrescenta-se no texto que essas pessoas terão o respectivo processo devidamente analisado e, até junho de 2025, decidido.
A Aima reconheceu que, como comprova a reportagem, muitos cidadãos estrangeiros têm buscado a via judicial para conseguir o agendamento. No entanto, segundo o comunicado, imigrantes acabam verificando que com a estrutura de missão tiveram um agendamento mais rápido.
"Nesta conformidade, sugerimos aos cidadãos estrangeiros que aguardem serenamente pela marcação e atendimento, assim evitando o dispêndio de recursos necessários", informou o órgão.
O que são zona geográfica de Lisboa e Ilhas
As informações obtidas pela reportagem dizem respeito aos Tribunais Administrativos e Fiscais nas seguintes localidades: Zona geográfica de Lisboa, que contempla Lourinhã, Cadaval, Torres, Alenquer, Azambuja, Sobral de Monte Agraço, Arruda dos Vinhos, Vila Franca de Xira, Loures, Odivelas, Mafra e Lisboa.
Os dados também se referem a tribunais administrativos e fiscais nas Ilhas, que são Açores e Madeira.
Íntegra da resposta da Aima à BRASIL JÁ:
"A AIMA é uma instituição que cumpre as suas obrigações pelo que, com naturalidade, cumpre toda as ordens que sejam emanadas do poder judicial.
Mais se informa que a AIMA está a fazer um esforço tremendo no sentido de regularizar as pendências registadas, assim procurando acolher com dignidade quem nos procura e, simultaneamente, conferir aos residentes as garantias devidas ao nível da segurança interna que cumpre acautelar.
Neste enquadramento reforça-se que a Estrutura de Missão tem a incumbência legal de assegurar que todos os cidadãos estrangeiros que tenham remetido a sua manifestação de interesse até ao dia 3 de junho de 2024 vão ver designada data para o agendamento nos diversos centros especializados que foram e serão abertos, para que o respetivo processo seja devidamente analisado e, até junho de 2025, decidido.
Mais referimos que, neste momento, e fruto da recuperação de pendências que se está a verificar, várias têm sido as situações em que cidadãos estrangeiros que recorreram à via judicial para obter o agendamento, acabaram por verificar que que tiveram marcação de agendamento mais rápida pela Estrutura de Missão.
Nesta conformidade, sugerimos aos cidadãos estrangeiros que aguardem serenamente pela marcação e atendimento, assim evitando o dispêndio de recursos necessários."