Mais de 1 600 profissionais de saúde assinaram uma carta enviada nesta quarta (8) à Presidência da República, ao chefe de Governo e ao procurador-geral da República contra a restrição de acesso ao Serviço Nacional de Saúde a imigrantes irregulares.
Os profissionais de saúde —médicos de várias especialidades, enfermeiros, fisioterapeutas, psicólogos, nutricionistas, técnicos auxiliares de saúde e técnicos de diagnóstico e terapêutica— consideram que o projeto de lei aprovado em dezembro no Parlamento viola o direito universal à saúde.
Além disso, os profissionais alertam que a exclusão da população indocumentada põe em risco a saúde pública, especialmente de populações vulneráveis, como crianças, grávidas e doentes crônicos.
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Para eles, o projeto de lei acaba “comprometendo a missão do SNS como um pilar da saúde pública e da igualdade de direitos”, portanto, os profissionais dizem que continuarão a garantir cuidados "a todas as pessoas, sem discriminação".
“Esta medida viola a Constituição, a legislação europeia e o código deontológico médico. Agravará desigualdades, prejudicará populações vulneráveis e irá comprometer a saúde pública”, lê-se na carta aberta, a que a Lusa teve acesso.
Detalhes do projeto de lei
O projeto de lei em questão prevê que só pepssoas que apresentem um comprovante para cobertura de cuidados de saúde poderão ter acesso ao Serviço Nacional de Saúde, “exceto no acesso a prestação de cuidados de saúde urgentes e vitais”.
Ficariam, então, excluídos imigrantes em situação irregular e indocumentados, além de cidadãos estrangeiros não residentes.
Na carta às autoridades, os signatários consideram que, na prática, a disposição legal, ao privar um segmento importante da população residente em território nacional do direito à proteção da saúde, “viola a garantia de acesso de todos os cidadãos e cidadãs”.
Os signatários do documento, incluindo a presidente da Federação Nacional dos Médicos, Joana Bordalo e Sá, lembram que essa garantia é consagrada na Constituição da República Portuguesa e na Carta de Direitos Fundamentais da União Europeia.
“No cotidiano, estes e estas utentes [pacientes] encontram já várias barreiras no acesso e manutenção de cuidados de saúde”, reforçam.
Os profissionais de saúde afirmam, ainda, que atuando na área têm receio de que a atividade deles sofra com a limitação, que no entendimento deles agrava desigualdades ao desfavorecer uma população que já está em situação de vulnerabilidade.
Alerta-se, também, para o fato de que as alterações à Lei de Bases da Saúde podem colocar em risco a saúde pública de toda a comunidade.
“Deixa de estar assegurado o acesso gratuito e regular à vacinação, bem como a adequada abordagem de doenças transmissíveis que representem ameaça para a saúde pública”, lembra-se no texto.
“Preocupa-nos ainda que a limitação no acesso a cuidados preventivos e atenção primária contribua para uma procura adicional pelos serviços de urgência, que passarão a ser a única porta disponível de acesso ao SNS”, completaram os autores.
A carta foi enviada às seguintes autoridades:
- presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa;
- presidente da Assembleia da República, José Pedro Aguiar-Branco;
- primeiro-ministro, Luís Montenegro;
- ministra da Saúde, Ana Paula Martins;
- e ao procurador-geral da República, Amadeu Guerra.
Em dezembro, mais de 800 profissionais de saúde assinaram uma carta aberta onde recusam cumprir a decisão, que consideram discriminatória, de impor novas limitações a estrangeiros não residentes no acesso ao SNS e admitem praticar atos de desobediência civil.
Na altura, o bastonário da Ordem dos Médicos, Carlos Cortes, se mostrou solidário com os profissionais que recusarem limitar o acesso de estrangeiros não residentes ao SNS e disse compreender eventuais atos de desobediência.
Com a Lusa