Luana Piovani em entrevista à BRASIL JÁ. Crédito: Faya Neto

Luana Piovani em entrevista à BRASIL JÁ. Crédito: Faya Neto

Luana Piovani: 'Eu sempre lutei pelos direitos das mulheres'

Em entrevista à BRASIL JÁ, a mãe, atriz e ativista diz —sem reservas— o que pensa

22/10/2024 às 17:20 | 7 min de leitura
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Atriz, mãe e ativista. É como se define Luana Piovani, que neste ano completou 48 anos de idade e 35 anos de carreira. 

Com mais de cinco milhões de seguidores no Instagram, a atriz tem usado o alcance de sua voz para falar —não apenas— sobre direitos das mulheres e das crianças, dois temas caros a ela, que é mãe de três filhos e que precisou recorrer às redes para exigir que seus direitos e os de seus filhos fossem respeitados. 

Neste momento, ela sofreu um cala a boca da Justiça portuguesa, que ficou ao lado de seu ex-marido Pedro Scooby sobre ter sua paternidade exposta. Piovani promete recorrer ao Tribunal Europeu para poder voltar a ter voz. Nesta entrevista, a atriz fala sobre seu ativismo, direito das mulheres e arte.

Assim você se descreve no Instagram: atriz, mãe e ativista pelos direitos das mulheres e das crianças. Uma ativista com cinco milhões de seguidores não é qualquer coisa. É falar para quase metade da população de Portugal.

Agora, eu entendi que eu sou ativista. Me apresentaram uma vez como ativista, e eu tomei um susto. Falei: 'Nossa, ativista?' Eu me posiciono há muito tempo. Acontece que às vezes umas coisas ecoam mais, outras vezes ecoam menos. Mas eu sempre pontuei as coisas. Então, decidi me chamar assim também.

Há ativismo para além das redes sociais?

Você está usando duas palavras mais contemporâneas: rede sociais e ativismo. Eu nunca me classifiquei como ativista. [Recentemente] Eu fui chamada de ativista por alguém numa entrevista. Foi aí que eu fiquei surpresa com esse nome, com a classificação. Eu sempre lutei pelos meus direitos, o que significa que eu também lutei pelos direitos das mulheres e das pessoas em geral. 

Muito antes de ter rede social, eu já era comunicadora. Eu abri o meu site quando eu tinha 20 anos de idade e, lá, eu me posicionava contra coisas que considerava erradas. Eu também sempre aplaudi coisas que achava que mereciam luz, que mereciam aplausos, que mereciam divulgação. 

Se isso não é ser ativista, então, eu não sei o que é. Eu sempre lutei pelo salário igualitário entre homens e mulheres dentro da Globo. Eu fui agredida e imediatamente me coloquei publicamente em uma época em que não havia a hashtag “ninguém larga a mão de ninguém”. Não tinha nada disso. 

Muito pelo contrário: eu sofri muito por ter denunciado uma violência. Então, eu me acho, eu me considero desde muito nova, desde que comecei a ser uma pessoa pública, uma ativista, porque sempre coloquei questões muito relevantes em pauta. Meu ativismo vai além das redes sociais há muito tempo.

 No Brasil, a Lei Maria da Penha completou 18 anos. O que mais precisa ser discutido na questão de gênero?

Apesar da Lei Maria da Penha ter 18 anos e de termos na legislação algumas coisas que nos protegem, na prática, somos assassinadas a cada seis horas no Brasil, sem falar da violência sexual. Então, ainda vivemos uma pandemia de violência de gênero. 

Eu acho que com o despertar das mulheres, as denúncias, o movimento de defesa da mulher vai ganhar cada vez mais força. Eu acho importante a pressão feminina para que as leis sejam mais bem elaboradas e cumpridas, porque a gente vê muita gente que pede medida de proteção e ainda assim acaba sendo assassinada, porque não teve proteção. 

Muita gente é condenada, e a pena cai para um terço e, no fim, cumpre um quarto da pena. Enfim, muita coisa tem que mudar.

E no caso do Brasil ainda se discute punir mulheres que fazem aborto em um retrocesso ao que diz hoje a lei.

Sou completamente a favor do aborto. Acho que o corpo é da mulher e quem decide sobre ele é ela. O que eu acho é que falta educação sexual, falta escola que acolha e informe aos educandos, aos jovens que, iniciando a vida sexual, existe grande possibilidade de se ter um filho e que são necessárias precauções. 

O homem não pode decidir sobre o corpo da mulher, até porque quem cuida desse filho não é o homem, é a mulher. Então, é uma decisão que muda bastante a vida dela.

Você se posiciona desde os 20 anos, ao contrário de outros artistas. Tenho a percepção de que o público passou a entender você e seus posicionamentos. Acha que o público quer um artista que toma posição?

Eu precisava de uma dose de otimismo. Que bom que você enxerga dessa maneira. Eu fico muito feliz, porque me dá uma sensação de que só eu tenho essa utopiazinha de entender a potência que é poder falar e ecoar. E acho que poucos entendem isso. E fico muito feliz que você, alguém esclarecido, veja que não são todos [os artistas] que se posicionam [mas que deveriam]. 

Sobre o público, a internet me abraçou. Mas eu tomei porrada por muito tempo. Eu nunca achei que alguém fosse me abraçar. Eu nunca esperei por isso. E isso [de ser abraçada] não muda a minha vida, meu percurso. Porque eu acho que, se Deus me deu essa potência, os mais de cinco milhões de seguidores e essa coragem, foi para que eu pudesse me posicionar. Eu entendi que é preciso coragem. 

As pessoas falam sobre eu não ter medo de ser cancelada. Não tenho, e eu tenho um trabalho exemplar. É por isso que as pessoas continuam me contratando. As pessoas gostam do meu trabalho. Então, eu sigo a minha vida muito bem.

E sem medo de cancelamentos.

Eu falei em uma entrevista sobre essa cultura do cancelamento. Eu não tenho medo dela, porque eu não dependo das redes sociais para viver. Eu até sei que as redes sociais ajudam, mas eu não tenho medo dela. 

Graças a Deus, eu construí minha carreira muito antes das redes sociais aparecerem, e é com a minha profissão que eu ganho o dinheiro que paga as minhas contas. Eu não sou influencer. Eu não dependo da opinião das pessoas para vender as minhas peças de teatro. 

As pessoas vão ao teatro por tratar de um assunto relevante, uma peça bem-produzida, que gera interesse e curiosidade. Mas isso é escolha. Eu também poderia escolher virar uma influencer e com certeza teria muito mais dinheiro, mas poderia ser uma vítima do cancelamento. 

Eu morro de compaixão das pessoas que colocam seu destino da mão de pessoas que não conhecem e é isso que se faz quando você depende das redes sociais para viver.

Você normalmente fala com mulheres. No comentário em que se posicionou contra a possibilidade de se privatizarem as praias brasileiras, estourou a bolha do público feminino, que é o que normalmente repercute você.

Essa onda [de repercussão] foi a maior que eu vivi na vida. Os homens também estavam a meu favor. A vida inteira eram só as mulheres a meu favor. As mulheres são metade do mundo e, mesmo dentro do universo feminino, metade é machista. 

Então, eu tenho um quarto do público a meu favor. Só que, dessa vez, eu tive todo mundo do meu lado, porque todo mundo quer a praia pública. Então, os homens vinham me dar parabéns. Coisa que não acontece normalmente.

Falando no seu público feminino. A BRASIL JÁ fez uma reportagem recentemente sobre mulheres e as dificuldades que elas enfrentavam aqui na Europa quando se divorciavam e precisam lutar pela guarda dos filhos. É um tema caro a você, que já tratou do assunto muitas vezes, inclusive, tocando na ferida do machismo institucional da Justiça portuguesa.

 Você sabe que eu acho que eu estou vivendo toda essa merda da história da mordaça* em Portugal para eu ir mesmo ao Tribunal Europeu [dos Direitos Humanos] e lá ganhar. Seria uma maneira de provar aqui que eles não sabem fazer. A minha advogada está muito segura. Ela falou que tem uma lei que diz que quando você é pessoa pública acaba exercendo uma função pública que é a de levantar questões. 

É um entendimento óbvio. Não faz o menor sentido [ser censurada]. Então, lá vamos nós. Não é fácil, mas mais uma vez estou levantando essas questões e ampliando a pauta. Eu acho que é um bom serviço nas redes sociais.

*Em favor do surfista Pedro Scooby, a Justiça portuguesa decidiu impedir que a atriz cite seu nome publicamente. A artista não pode usar as redes sociais nem entrevistas para falar sobre assuntos relacionados ao atleta e à criação dos três filhos que tiveram juntos.

Fora da Justiça e do espaço das redes sociais, você atua no mundo real no projeto Oráculo, de apoio a mulheres.

 São encontros com o objetivo de dar informação e acolhimento a mulheres. Ocorreram em São Paulo, Portugal, Genebra e em Madri.

Nesses encontros, em partes tão diferentes do mundo, você percebeu alguma diferença no comportamento das mulheres quando vão compartilhar suas experiências?

Acho que a diferença é que as mulheres brasileiras falam mais e se sentem mais encorajadas a contar suas histórias enquanto as portuguesas, por exemplo, vão se soltando conforme veem as brasileiras presentes nos encontros falando. Eu quero realizar mais ainda este ano. É um projeto importante.

Trinta e cinco anos de carreira. Há algum personagem que você ainda queira fazer?

Queria muito fazer uma coisa regional. Quando a gente fica longe do Brasil, eu tenho saudade de um Brasil que é o Brasil que eu carrego dentro de mim, que é o que eu admiro. É o Brasil da cultura, o Brasil do brasileiro de verdade. Não é o do brasileiro que está com a camiseta verde e amarela na rua. É o do brasileiro de verdade, o que sorri, o que faz bolo e leva pro vizinho. 

É o do brasileiro que trabalha até velhinho. Aquele brasileiro que a velhinha tá andando de sombrinha na rua. O Brasil de pessoas gentis, receptivas. Tenho saudade de coisas regionais, tipo do interior de São Paulo, dos estados do nordeste. 

Pernambuco, Goiás ou mesmo do Sul, tudo é tão gostoso. Como já viajei muito no Brasil, com teatro e com o cinema, eu tenho saudade desse lugar bem culturalmente brasileiro. Então, eu queria muito fazer alguma coisa regional.

Você atuou em produções de tevê aqui e no Brasil. Percebe diferenças entre as produções brasileiras e portuguesas?

Existe diferença sim entre as produções. Aqui em Portugal as pessoas trabalham com um ritual um pouco mais lento, mas calmo, sem muitos atropelos. A ansiedade é um pouco mais intensa na produção brasileira. No Brasil, nós temos mais equipamentos técnicos, as pessoas que fazem tevê entendem mais de técnicas, e aqui as coisas são mais simples.

Você vai estrear este mês o seu stand-up music.

 Que loucura. Vai ter muita coisa nova. Sou eu, o stand-up. Então, é a Luana ali. Eu vou contar histórias da minha vida, histórias pessoais. E eu também vou cantar. Eu costuro essas histórias com algumas canções. 

Há o desafio de me expor num lugar onde eu não me sinto cem por cento segura, apesar de estar super bem assistida. Mas será um entretenimento gostoso. Na verdade, é uma experiência. Eu tô convidando o público para viver um encontro comigo.

Para alguns atores, como Pedro Cardoso, que me disse em entrevista aqui na BRASIL JÁ, o stand-up não é necessariamente um espetáculo teatral.

Eu sempre falei tanto das pessoas que iam para o teatro para ter uma conversa de bar. E, olha só, eu estou indo ter uma conversa de bar. Mas como eu sou atriz e menos comediante, você vai ver um stand-up que tem cenário, figurino, estrutura teatral. 

Por isso, eu estou chamando de stand-up music, porque eu canto também. Mas são histórias pessoais que eu conto com imensa cumplicidade do público. Primeiro porque eu estou contando de frente para o público, segundo porque eu estou convidando o público para ir ao palco comigo.

De onde surgiu a ideia de um stand-up?

Era para ser uma celebração de 30 anos de carreira, mas acabou virando de 35 anos, porque tivemos dois anos de pandemia, mais dois anos procurando uma pauta em teatro e não achando. Acabou que viraram 35 anos. A estreia será no dia 21 de outubro no Teatro do Casino Lisboa. 

E como faltam três meses para o fim do ano, quais os planos para 2025?

Na verdade, eu pretendo viajar com o meu stand-up por Portugal. Como é uma peça muito restrita e se trata de uma experiência, eu quero viajar por aqui. Eu estou falando de oitenta, de cem pessoas por espetáculo. Qualquer lugar aqui em Portugal tem oitenta, cem brasileiros. 

Uma coisa que me dá muito prazer é viajar com o teatro. Aqui, os teatros são ótimos, em todas as cidades têm ótimos teatros. Depois disso, eu tive uma proposta de fazer uma série brasileira, e que deve ser para o primeiro semestre do ano que vem, mas ainda é uma coisa embrionária. Uma comédia romântica com a direção da Tatiana Verano, rodada no Brasil.

* Cantos da Lua

Estreia: 21 de outubro de 2024

Local: Teatro do Casino Lisboa

Luana Piovani estreou nesta segunda (21) "Cantos da Lua", em Lisboa - Foto: Faya Neto


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