Marco Lessa, empresário. Crédito: Divulgação

Marco Lessa, empresário. Crédito: Divulgação

O rei do cacau: como Marco Lessa levou o chocolate brasileiro ao mundo

Criador do Chocolat Festival, o empresário baiano impulsiona a produção de chocolate de alta qualidade no Brasil com iniciativas globais

31/12/2024 às 07:14 | 4 min de leitura | Edição Impressa
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Criador do Chocolat Festival, Marco Lessa leva o nome do cacau da Bahia e do Pará para o mundo, com o crédito de ter sido um dos principais incentivadores da produção de chocolate nos dois estados.

Se antes de sua atuação a vocação da Bahia e do Pará era essencialmente agrícola, hoje a produção do chocolate de alta qualidade movimenta a economia local e fortalece a marca do Brasil mundo afora.

Lessa quer mais. Avança sobre outros mercados de produtos de origem sob o selo Origem Week e incentiva o estreitamento de relações comerciais internacionais por meio da Casa Brasiliana.

A seguir trechos da entrevista que Lessa, nascido no sertão baiano e radicado em Braga, deu à BRASIL JÁ.   

Como surgiu o interesse pelo mercado gastronômico? 

Parte do prazer de comer e descobrir. Eu venho do sertão da Bahia, de Guanambi, que é uma região que tem uma forte relação com Goiás e, principalmente, com o Norte de Minas Gerais.

Além de ser uma grande produtora de frutas, com destaque para manga-rosa, tamarindo e pequi, a região tem muitas influências da rica culinária mineira. E cresci em uma família que sempre teve cozinheiras de mão cheia.

Depois, fui estudar em Salvador e tive contato com outro tipo de cultura gastronômica, que é da comida de raiz africana, do santo, o acarajé, abará, vatapá, caruru e tudo mais. Foi a descoberta de outro mundo. 

E o encontro com o cacau, o chocolate, dos quais você se tornou embaixador com o Chocolat Festival? 

De Salvador segui para estudar administração em Ilhéus, que fica a seis horas de carro de Salvador. Em Ilhéus, há o cacau. No final dos anos 1980, o cacau não era considerado um ativo gastronômico. Era uma cultura agrícola, que gerava forte resultado financeiro como matéria-prima para indústria, não como chocolate.

Em 1991, estive no Festival Mundial de Publicidade em Gramado. Mesmo estando no centro da cena do cacau em Ilhéus, precisei sair de lá para conhecer a do chocolate. Fui a Gramado por conta da propaganda e descobri o chocolate, porque até então a referência de chocolate artesanal, no Brasil, era Gramado.

Voltei para Ilhéus ainda sem fazer grandes relações com o cacau. Havia uma loja chamada Chocolate Caseiro de Ilhéus nos moldes das de Gramado, até em estilo suíço. Mas era só.

Como eu tinha uma agência de publicidade e propaganda, a TV Globo me convidou para produzir localmente a primeira versão da novela Renascer. Descobri aí o verdadeiro mundo do cacau [a novela tem como cenário fazendas de cacau] e sua riquíssima cultura.

Percorri fazendas para as gravações e constatei o seguinte: nós tínhamos uma região que começava a ficar decadente, com o cacau perdendo espaço. Pensei: como é que uma cadeia produtiva tão importante não consegue reverter a situação enquanto uma cidade no Sul do Brasil é tão calcada no chocolate? 

E como achou a resposta? 

Buscando conhecimento. Me aprofundei estudando como é possível agregar valor ao se produzir chocolate em vez de apenas colher o cacau. Na Bahia, a conta não fechava. O quilo do cacau custava 150 reais (25 euros) enquanto o quilo do chocolate, trezentos reais (cinquenta euros).

E poderia custar mais: quatrocentos, quinhentos reais (83 euros). É uma diferença absurda. Falei: por que nós não fazemos chocolate? E ouvi todo o tipo de resposta: que não dava por causa do clima, por causa da cultura; eu ouvi de tudo. 

Como o cenário começou a mudar? 

Começamos a pensar em uma indústria que trouxesse impacto econômico e social, com estímulo ao surgimento de marcas de chocolate e iniciativas na área, fazendo chocolate com mais qualidade e com mais cacau.

Na época, ainda nem havia se popularizado o termo bean-to-bar, ou seja, o chocolate sendo feito diretamente do fruto, sem aditivos. Criamos o primeiro festival de chocolate da Costa do Cacau, a semente do que se tornou o Chocolat Festival. Detalhe: como fazer um festival de chocolate sem chocolate?

Tínhamos o Chocolate Caseiro de Ilhéus; minha mãe fez bolo; Luana, minha esposa, brigadeiro; uma amiga fez trufa e convidamos o Alexandre Costa, da Cacau Show, para falar sobre produção de chocolate. Ele já tinha setecentas lojas de chocolate na época e era praticamente o coach do chocolate. Queria muito que ele desse o exemplo de que chocolate é viável. 

Marco Lessa, empresário. Crédito: Divulgação

Qual foi o resultado? 

Um sucesso. Sabe aquele filme de dança que dá vontade de sair dançando? No fim do evento, todo mundo queria fazer chocolate. Como tínhamos agência, ajudávamos na arte, rótulos. Depois, com a movimentação, veio o convite para participar do estande do Brasil no Salão de Paris.

Também começamos a trazer grandes expoentes do chocolate mundial. Esse foi um ponto importante. Comecei a investigar quem eram as maiores referências do chocolate no mundo, tanto na produção, como especialistas, escritores, pesquisadores. Banquei a vinda dessas pessoas para abrilhantar o evento.

Em 2013, fizemos o primeiro festival no Pará; em 2020, em São Paulo [pouco antes da pandemia] e, por fim, começamos em Portugal em 2022, no Porto, no Wow. 

O que mudou no setor desde criação do Chocolat Festival? 

Temos uns estudos curiosos sobre a evolução das embalagens de chocolate no Brasil. Antigamente, era difícil ver a imagem do cacau, porque muitos chocolates tinham o percentual muito baixo do fruto. Hoje se não há o desenho do cacau, tem ao menos a ênfase na percentagem.

O cacau deixou de ser coadjuvante. O número de produtores de chocolate da mais alta qualidade só cresce e se fortalece no cenário mundial. A partir da feira do chocolate em Portugal, surgiu o festival Origem Week, que teve sua primeira edição nesse ano em Portugal e na Bélgica.

O Brasil tem produtos incríveis, além do cacau e do chocolate, como a castanha do Pará, o guaraná, o café especial, o charuto e outros tantos que decidimos expandir para um evento paralelo. A motivação é a mesma: mostrar nossos produtos ao mundo e incentivar novos negócios. 

E a Casa Brasiliana tem este mesmo princípio. 

Nesses anos de feira, a percepção das dificuldades no fechamento de negócios entre produtores e compradores no exterior nos despertou para a criação de um hub físico, com espaço para exposição de produtos e assessoria para o fechamento de negócios, em um processo mais centralizado.

A Casa Brasiliana, situada no WOW, no Porto, é um showroom permanente de produtos brasileiros, da gastronomia à moda, onde aceleramos o processo de conexão e de contato entre esses produtos e os compradores internacionais.

No ano que vem, queremos intensificar rodadas de negócios. O nosso objetivo maior é fortalecer os pequenos. A ideia, por exemplo, é fazer o indígena que está desenvolvendo o artesanato, a biojóia, o chocolate, criar conexões e negócios, numa transformação regional, estadual, nacional e internacional. 

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