Há mais de dois anos, o estudante Gustavo Isaac dos Reis tenta solucionar um problema que a princípio parece ser simples: emitir uma segunda via da autorização de residência. Sem o documento essencial, o brasileiro já perdeu importantes oportunidades de trabalho e está com a vida estagnada.
"Perdi minha carteira com todos os documentos, inclusive o título de residência. Fui na delegacia, fiz um boletim de ocorrência, mas até hoje meu documento não chegou", contou Gustavo, que tem 20 anos e faz um curso técnico de Apoio à Gestão Desportiva, em Lisboa.
O rapaz chegou a Portugal em agosto de 2021 com um um plano traçado: estudar e seguir com a carreira no futebol. Entretanto, a interminável jornada para recuperar o título é o que hoje tem consumido seus dias. Ele resume a situação com duas palavras: frustração e burocracia.
A espera para ter novamente o documento em mãos atrapalha o dia a dia e seus planos para o futuro. O mais doloroso para ele é não poder jogar futebol como atleta contratado. O esporte é a sua grande paixão e principal objetivo profissional.
"Para jogar aqui, quem é estrangeiro precisa do título de residência. Eu tive que deixar minha carreira de lado porque não posso jogar. Vim para Portugal para estudar e jogar futebol, mas isso ficou parado há mais de um ano", lamentou.
O jovem chegou a fazer testes em alguns clubes portugueses, como o Belenenses e o Carcavelos.
"No clube de Carcavelos me deixaram treinando até eu conseguir o documento, mas como eu não consegui, tiveram que me dispensar, já que eu não ia jogar", contou.
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De porta em porta e sem respostas
Gustavo teve em mãos sua primeira autorização de residência em janeiro de 2022, depois de cinco meses da chegada a Portugal. Foi pouco depois disso que perdeu a carteira e precisou pedir uma nova, no então Serviço de Estrangeiros e Fronteiras.
Com a extinção do SEF, o processo foi transferido para a Aima, em funcionamento desde outubro do ano passado. "Desde então, a resposta é sempre a mesma: ‘O processo está em andamento’. Nunca recebi o documento", afirmou.
Ele relatou à BRASIL JÁ idas frequentes ao SEF e, posteriormente, à Aima, muitas vezes enfrentando longas filas e falta de clareza sobre os prazos. "Minha avó e eu acordávamos de madrugada para ir lá. Ficávamos o dia inteiro na fila, mas sempre ouvíamos a mesma coisa. Fomos mais de quatro vezes."
O jovem tentou contato por e-mail e telefone, mas os resultados foram igualmente frustrantes. "Nunca atendem por ligação. Por e-mail, mandei vários, e nada." Atualmente, Gustavo avalia entrar com uma ação judicial contra o governo para ter o direito garantido.
Segundo explica o rapaz, a falta do documento também afeta sua mobilidade. Ele não pode sair de Portugal porque corre o risco de não conseguir retornar.
"Minha mãe mora na Bélgica e o resto da minha família está no Brasil. Agora, no final do ano, queria passar o Natal com minha mãe, mas não posso viajar sem o título."
Este ano, ele até conseguiu viajar ao Brasil para o funeral do avô, mas precisou apresentar o registro de ocorrência comprovando que perdeu o documento ao controle de imigração. "Foi uma exceção, mas eu sei que não seria o mesmo se fosse para outro país europeu."
A luta contra a burocracia
A demora no processo escancara as dificuldades enfrentadas por muitos imigrantes em Portugal que lidam com um sistema burocrático e ineficiente.
"Eu nem sei onde está meu documento agora. A casa onde eu morava na época da solicitação é onde o cartão deveria chegar, mas a pessoa que vive lá não recebeu nada. Minha tia sempre vai lá buscar, mas nunca chegou."
Enquanto espera uma solução, Gustavo continua a estudar tenta manter os sonhos vivos.
Orientações da Aima
Em 28 de novembro, a reportagem entrou em contato com a Aima para saber do andamento do caso de Gustavo, mas não recebeu resposta até o fechamento da reportagem. O espaço segue aberto caso a agência decida se manifestar.
No site da Aima, a orientação para casos de perda de documento e necessidade de emissão de uma segunda via da autorização de residência é que o pedido deve ser iniciado por meio de uma plataforma eletrônica e precisa ser entregue presencialmente.
O processo requer o preenchimento de um formulário próprio, assinado pelo requerente ou, no caso de menores ou incapazes, por um representante legal, e pode ser submetido em qualquer direção ou delegação regional da agência.
Após a análise, o pedido pode ser encaminhado para a delegação da área de residência do requerente.
Entre os documentos exigidos estão:
- duas fotografias tipo passe com fundo liso,
- passaporte ou outro documento de viagem válido,
- declaração justificando a necessidade da segunda via,
- e, no caso de perda, furto ou roubo, a cópia da participação (boletim de ocorrência) feita à autoridade policial.
Outros casos específicos exigem a devolução do título inicial, em situações de mau estado de conservação, ou uma declaração de destruição sob compromisso de honra.